(Óleo s/tela, 60x70) (...)
"Aquele que tem a pretensão de se recordar palavra por palavra duma conversa pareceu-me sempre um mentiroso ou um mitómano. Pela minha parte, nunca retenho mais que alguns fragmentos, um texto cheio de buracos, como um documento comido pelos vermes. Não oiço as minhas palavras, no preciso instante em que as pronuncio. Quanto às do outro, escapam-me e recordo-me tão-só do movimento de uma boca ao alcance dos meus lábios. (...) Depois, e excepto no que se refere ao pormenor puramente estratégico, há uma lacuna na minha memória. Creio que existem em cada vida períodos em que um homem existe realmente, e outros em que não é mais que um aglomerado de responsabilidades, de fadigas e, para as cabeças fracas, de vaidade. (...) "
Marguerite Yourcenar, in O Golpe de Misericórdia